Olá, pensei em me apresentar só no final, mas acho muito estranho conversar assim, sem falar nem ao menos quem sou. Pois bem, hoje eu sou a Raici, autora de mim, persistente e teimosa nas horas vagas, cantante, rebolativa e tagarela. Cozinho palavras e afetos. E busco o extraordinário ao meu modo. Sinta-se à vontade, e, caso queira, passe esse texto adiante. Se inscreva pra receber meus escritos sempre que eles decidirem existir. Bon Appetit!
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Eu não quero ser uma cozinheira. Eu quero cozinhar.
Cozinheiros lidam com stress e pressão, uma exigência de impecabilidade própria do Chef. Eu, por minha vez, sou péssima de funcionamento nessas condições. Faço meio que tudo de olho, e se me pressionam, erro o ponto, amargo a comida, tensiono as texturas. Eu gosto de ir mexendo a panela e ir visualizando a comida se propondo enquanto vou regando com conversa mole e braço firme. Gosto muito mais desse preparo singular e quase negligente que não cabe na profissionalidade cozinheira. A verdade é que sou bem amadora, e é assim que prefiro cozinhar, me preocupando em gerar vínculo afetivo gostosinho bem mais que conseguir acertar o ponto pra fazer a melhor salada que já comeu. Embora você vá lembrar da salada porque ela está atrelada a um contexto, não é uma receita descolada do mundo, ela carrega em si história. E assim chegamos a um dos meus entendimentos-bússola:
Fazer comida passa por fazer histórias, e vice-versa.
É uma constante que se retroalimenta.
Acho que assisti demais Ratatouille e comecei a crer real que “Anyone Can Cook!”. Para além desse empoderamento de que qualquer um pode cozinhar, o filme mostra um se alimentar que vai além de dar nutrientes ao corpo e salienta outras nuances do comer, numa perspectiva cultural, social e de pertencimento. Talvez por isso esta obra me toque num lugar tão especial. Deixe-me explicar. O estranhamento proporcionado pelo exílio, pelo sair da terra natal provocou em mim uma necessidade extrema de retornar ao conhecido, de encapsular o cotidiano, de descobrir algo que me fizesse sentir em casa de alguma maneira. E qual a melhor forma de voltar no tempo, sem uma máquina de ficção científica e sem precisar retornar geograficamente? Isso mesmo, com comida. Vai dizer que quando você dá aquela mordida num docinho favorito você não é transportado para um lugar de conforto? Bom, eu sou. E pensando pelo prisma da minha vida, a comida funciona enquanto alento, marcador de origem e pertencimento.
Esse meu processo amador de cozinhar extrapolou os ingredientes costumeiros, e começou a se esparramar pela escrita em 2020, quando participei do curso Inventário de Sentidos, ministrado pela Andreia Pires. O curso em questão suscitou uma escrita criativa mais consistente e jogou luz sobre o fator humano - Alô Assis Brasil - que ignorantemente eu negligenciava. E foi a partir daí que comecei a enveredar pela escrita e pela feitura de receitas com intencionalidade. Olhei com maior atenção para meu comportamento com os meus afetos e como isso passou e passa pela comida, pelo cozinhar. Dito isto, deixo aqui uma receita fácil and gostosa-não-óbvia, primeira de tantas que virão.
Salada de Grão-de-Bico com Maçã e Pepino
Ingredientes
grão-de-bico
maçã verde
pepino japonês
vontade de se mimar
cebola
sal
tempo ocioso
tempo de qualidade
pimenta preta
limão
Ingredientes Molho:
limão
azeite de oliva
mostarda
melado de cana
sal
finesse
Modo de Preparo
Junte a vontade de se mimar com um tempo ocioso com forte potencial para ser um tempo de qualidade. Misture-os bem. Em uma panela deixe o grão-de-bico de molho por pelo menos 12h. Essas horas de molho vão ajudar a cozinhar melhor e evitar os efeitos flatulentos. Passado o molho, descarte a água, lave duas ou três vezes mais. Em seguida, adicione sal e pimenta preta moída, cubra com água e ponha para cozinhar. Após pegar pressão, ignore o medo da vida adulta traduzida em utensílio doméstico e cozinhe por mais ou menos 10 minutos. Enquanto isso, corte o pepino japonês, a maçã verde e a cebola em cubos. No caso da cebola, adicione um pouco de água quente para abrandar a acidez. Inclusive queria que alguém tivesse me ensinado a fazer isso antes. É prudente colocar um pouco de suco de limão por cima da maçã verde para não ficar aquele aspecto estragado. Em um recipiente junte todos os ingredientes, misture levemente. Para o molho, pegue a finesse do agridoce, junte mostarda, azeite de oliva, podes usar o suco do limão que usamos nas maçãs, adicionar uma pitada de sal e melado, misture bem. Sirva a salada acompanhada do seu rico molhinho.
Rendimento: Muitas porções já que faço as quantidades segundo o que deus toca no meu coração.
Acompanhamentos: Eu comi com um risotto de calabresa onde usei licor de butiá no lugar do vinho branco, mas essa já é outra receita, conto pra vocês noutro momento. Quem sabe.
Por fim, essa news nasce da vontade de contar histórias das minhas comidas e proporcionar receitas para que você possa construir as suas próprias relações com esses alimentos, eu espero que vá além de fins fisiológicos. Perdoem se por acaso os ingredientes deste texto não deram liga suficiente, mas escrita e comida são assim mesmo, é fazendo que se acerta o ponto. Até mais.
não tenho palavras na minha despensa capazes de expressar a gostosura que é isso aqui! já amei, raici! espero criar coragem para reproduzir as receitas e fico no aguardo de outras delícias.
"Após pegar pressão, ignore o medo da vida adulta traduzida em utensílio doméstico e cozinhe por mais ou menos 10 minutos. " - nossa, eu ri muito disso aqui, pois a minha mãe simplesmente faz de tudo com a panela de pressão (mete debaixo da torneira pra sair pressão mais rápido etc.) então meio que cresci vidaloka que nem ela e não tenho medo do utensílio doméstico hahaha (mas sei dos perigos).
coisa boa ter news nova e com olhar renovador sobre coisas antigas.
parabéns, raici! <3